Ikko-Ikki

Postado em Atualizado em

 

               Capazes de ameaçar até mesmo daimyos como Oda Nobunaga e Ieyasu Tokugawa, os ikko-ikki foram uma das facções proeminentes do período sengoku, mesmo sem prestar respeito à hierarquia social japonesa. Literalmente um bando de camponeses e monges que lutavam pela sua terra prometida, os ikko-ikki, cujos preceitos budistas que seguiam e o fervor religioso com o qual lutavam, se tornaram um símbolo do desafio contra os daimyos em uma rebelião que assolou o já conturbado, e, por isso, ainda mais disputado, Japão feudal.

               Os ikko-ikki eram em sua maioria monges budistas e camponeses, em conjunto com alguns nobres locais, que seguiam a crença da seita budista Jodo Shinshu, a terra pura, que ditava que todos os seus seguidores seriam salvos somente pela graça de Amida Buda. O líder da seita em Hongan-ji e provável pessoa de influência por trás dos ikko-ikki era o monge Rennyo, que cuidadosamente se distanciava das atitudes violentas dos ikko-ikki e da rebelião como um todo, por mais que usasse o fervor religioso dos seguidores para defender seus próprios assentamentos budistas.

               Apesar disso, os ikko-ikki não eram centralizados e, comparados com as outras forças do período sengoku, eles eram bastante desorganizados. Entretanto, devido a ser um movimento estritamente popular, seus números começaram a crescer e eles começaram a atrair a ira de Oda Nobunaga e, mais tarde, Ieyasu Tokugawa, que os viam como uma ameaça principalmente econômica e política no caminho de suas ambições.

Rennyo, líder da seita do Jodo Shinshu

               Por serem principalmente camponeses e monges, o equipamento dos ikko-ikki era, em sua maioria, precário, comparado com a elite guerreira e a infantaria de linha da época. Com uma grande diversidade de equipamento, boa parte dos ikko-ikki usavam os tradicionais robes budistas, em conjunto com os chapéus de palha cônicos, que usavam como proteção para suas cabeças. Em alguns casos, os ikko-ikki usavam alguns pedaços separados de armaduras e os mais abastados usavam armadura completa.

               Como armas, a naginata, por ser mais barata, era a mais comum entre os rebeldes, por mais que katanas e tantos também ganhassem seu espaço entre eles. O uso de arcabuzes, apesar de real, era raro. Por mais que não seja necessariamente um equipamento de combate, ao contrário das forças tradicionais do período sengoku, os banners levantados pelos ikko-ikki, ao invés de carregarem o símbolo do daimyo por quem eles lutavam, estavam inscritos dizeres budistas.

               As táticas dos ikko-ikki não se diferenciava muito das táticas usadas por outras forças do período, mas o fator mais proeminente contra as forças as quais eles lutavam era, justamente, o exacerbado fervor religioso o qual lhes era empossado, permitindo que eles resistissem durante cercos e batalhas completamente desiguais por períodos longos de tempo.

Monge guerreiro, comum entre os ikko-ikki, e seu equipamento

               Os ikko-ikki lutavam principalmente em cercos, entre esses, os que mais ajudaram a definir a sua reputação foram os cercos de Nagashima. O primeiro cerco de Nagashima ocorreu em 1571, na primeira vez que as forças de Oda Nobunaga tentaram tomar a fortaleza.

               Com forças equiparadas, estimando 20 mil para cada lado, muitos dos samurais de Nobunaga pereceram enquanto tentavam cruzar um dos rios que cercava a fortaleza. Sob intenso fogo e presos em um dos diques, os ikko-ikki inundaram as forças inimigas e Nobunaga levantou o cerco, desistindo de tomar a fortaleza, por enquanto.

               O segundo cerco de Nagashima ocorreu em 1573, quando Nobunaga tentou, novamente, tomar a fortaleza, dessa vez com uma força substancialmente maior que a anterior. Contando com um número muito grande de arcabuzeiros, eles se tornaram virtualmente inúteis assim que começou a chover no campo de batalha.

               Os arcabuzeiros dos ikko-ikki, entretanto, mantiveram suas armas protegidas e abriram fogo contra Nobunaga assim que a chuva parou, chegando bem próximo de matar o daimyo. Nobunaga foi forçado a se retirar, com a sua reputação de mestre em táticas de armas de fogo manchada. Com um rancor dos ikko-ikki guardado há 3 anos, Nobunaga retornaria para a fortaleza para iniciar o terceiro e último cerco em 1574.

               Uma frota marítima comandada por Kuki Yoshitaka bloqueou seus portos e bombardeou a fortaleza, privando os ikko-ikki de mantimentos básicos. O apoio naval permitiu que Nobunaga conseguisse penetrar na ala oeste da fortaleza pela primeira vez, encurralando seus inimigos nos monastérios de Ganshoji e Nagashima após um ataque simultâneo em três frentes. Com fome e com sede, as previsões para o fim do cerco para os próprios ikko-ikki não pareciam muito esperançosas.

               Isso piorou quando Nobunaga mandou construir um muro de madeira que cercou o forte inteiro, terminando de isolar completamente os ikko-ikki. Após o fim da construção da paliçada, Nobunaga mandou incendiar a mesma e o fogo se alastrou por toda a fortaleza. Dos aproximadamente 20.000 ikko-ikki, não houve nenhum sobrevivente e a fortaleza de Nagashima foi completamente destruída.

Ikko-ikki em combate

               Antes de sua derrota em Nagashima, os ikko-ikki já tinham começado a se enfraquecer em 1564, após a sua climática derrota na batalha de Azukizaka, contra o clã Matsudaira, aliados dos Tokugawa. Mesmo após os cercos de Nagashima, os ikko-ikki mantiveram-se seguros na fortaleza de Ishiyama Hongan-ji, que em 1580 viria a ser destruída, novamente por Oda Nobunaga, após um longo e árduo cerco, para ambos os lados.

               A perda de Ishiyama Hongan-ji, que era a sua principal fortaleza, eliminou a força restante dos ikko-ikki. Alguns anos após sua destruição, o último dos ikko-ikki cortejou o sucessor de Nobunaga, Toyotomi Hideyoshi, e se aliou a ele para lutar contra seitas budistas rivais, encerrando com o movimento e, por consequência, também com a sua busca pela sua “terra pura”.

Batalha de Azukizaka

               Sendo uma das forças mais singulares do período sengoku, os ikko-ikki e suas pretensões religiosas ameaçaram até mesmo os mais poderosos senhores feudais da época. Servindo como ferrenhos oponentes daqueles que queriam unificar o Japão, os ikko-ikki deram trabalho e foram um dos principais obstáculos e objeto de ira de um dos mais icônicos daimyos da história japonesa, Oda Nobunaga, a quem eles conseguiram vencer algumas vezes, mesmo sem garantir a própria sobrevivência a longo prazo. Marcando a história japonesa com seus ideais e fervor religioso, os ikko-ikki servem como exemplo de como a religião era uma proposta de salvação em um país assolado pela guerra.

Fontes:

TURNBULL, S. Japanese warrior monks AD 949 – 1603. Reino Unido: Osprey Publishing, 2003. 64 p.
TSANG, C. R. War and faith; Ikko Ikki in late Muromachi Japan. Estados Unidos: Harvard Univrsity Asia Center, 2007. 275 p.
DOBBINS, J. C. Jodo Shinshu: shin buddhism in medieval Japan. Estados Unidos: University of Hawaii Press, 2002. 264 p.
BAKER, M. Militant buddhists: a look at the Ikko-Ikki. Disponível em < http://www.samurai-archives.com/ikk.html > Acessado em 24 de Maio de 2015.

Um comentário em “Ikko-Ikki

    [Especial] Tanegashima « Tormento Pabulum disse:
    18 de dezembro de 2016 às 13:26

    […] Ler também: Ashigaru, Samurai e Ikko-ikki […]

    Curtir

Deixe um comentário